Pode um casal sobreviver a um segredo? Até que ponto será aceitável a existência de segredos entre maridos e mulheres, mesmo quando o conhecimento de determinados factos pode alterar a vida desse par para sempre? Lembro-me
perfeitamente de um dia ter discutido com uma pessoa especial sobre até
que ponto um acidente grave, uma incapacidade de um elemento do casal,
uma doença de um dos filhos, daquelas que permanecem para a vida inteira
poderia influir num casamento, na felicidade de duas pessoas que
juravam constantemente promessas de amor eterno. Isto a propósito de
alguns casais que se separam à primeira contrariedade e de "para
sempres" e "até à eternidades" que se revelam sempre demasiado frágeis.
Sosseguei-a com a minha resposta, sincera nas minhas convicções. Aliás,
não acredito que a maioria das pessoas desse outra resposta, mesmo
aquelas que um dia passaram pelo mesmo e acabaram por se separar. Há
coisas que só mesmo quem passa por elas, cada caso é um caso, cada
pessoa reage de forma diferente e por muito que nos conheçamos raramente
conseguimos antecipar as nossas reacções a determinados factos. Já me
tinha esquecido desta conversa, ocorrida no interior dum autocarro a
caminho do fórum Almada, há coisa de quatro anos atrás, até
assistir a Segredos de Família (the memory keeper's daughter), sem
maiores expectativas do que teria se fosse ver algum daqueles telefilmes
familiares da TVI de fim de semana. Confesso que o elenco - apesar da
minha admiração por Emily Watson - não contribuiu para alterar a minha
opinião pré-concebida, sustentada convictamente apenas até aos primeiros
minutos do filme, que nos agarram desde logo à história e que nos fazem
pensar desde logo: "E se?... fosse connosco?". Essencialmente, o filme
conta-nos a história de um casal (Dermot Mulroney e Gretchen Mol) nos
momentos que antecedem o nascimento do seu primeiro filho. Na ausência
do médico, o marido - também doutor - resolve fazer ele próprio o parto,
ajudando a dar à luz não um, mas dois bebés de sexos diferentes. O
rapaz é uma criança perfeita, enquanto a rapariga sofre do síndrome de
Down. Assustado por antecedentes familiares no seu passado relacionados
com a doença, o protagonista resolve "esconder" a menina da sua esposa,
contando-lhe que não sobreviveu ao parto, entregando a criança à
enfermeira (Emily Watson), para que a levasse para um lar. Desta forma,
pensava, a família seria feliz, sem os sacrifícios e a possibilidade de
uma morte prematura que fizesse desmoronar a harmonia e a felicidade do
casal. Todavia, o que o filme nos mostra é um contraste enorme entre a
vida do protagonista no seu seio familiar e a da enfermeira, que
desobedecendo resolve cuidar da menina como sua filha, e que resulta num
drama comovente sem ser demasiado lamechas.
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