Poucas
vezes expressões como "todos os caminhos vão dar a Roma" ou "como o
mundo é pequeno" fizeram tanto sentido como quando aplicadas ao
vastíssimo e ilimitado mundo da net. Parece à primeira vista um
contra-senso, mas não será tão estranho assim. Quantas vezes já não
entraram num outro blogue e constataram que conhecem a maior parte
daqueles que o seguem e/ou que o comentam? Não ficaram já com aquela
sensação de que, no fundo - por maior que seja a distância que nos
separa - somos todos uma família? Numa época em que o indivíduo cada vez
mais tende a isolar-se dos outros numa procura de protagonismo tantas
vezes estéril ou a padecer de um dos grandes flagelos deste século - a
solidão -, há uma maior apetência para se refugiar nas realidades
virtuais e a construir aí o seu círculo de amizades, o ombro amigo e
confidente nas pessoas que pouco ou mal conhece, como se essa
particularidade o protegesse das armadilhas da vida real. As pessoas têm
hoje muito medo da realidade, com a crise económica e de valores a
influenciar e de que maneira todos os seus relacionamentos e
expectativas. Os filhos preferem os computadores e os videojogos ao
contacto com os pais, as telenovelas e o futebol dividem os casais e
silenciam as antigas conversas à volta da mesa, o dinheiro - esse
maldito dinheiro - tomou um papel demasiado preponderante nas relações,
onde amar e ser amado já não é só por si suficiente. Tornou-se fácil
magoarmos os nossos sentimentos. É aí que entram os irresistíveis e
perigosos chat's, os messengers, os blogues e os grupos sociais como o
Facebook, o Tagged, o Hi5, a Netlog, o Twitter ou o Orkut dos nossos
irmãos brasileiros. Ninguém conhece verdadeiramente ninguém e aí é que
está toda a atracção e mistério deste mundo paralelo onde cada vez
perdemos mais tempo, gastamos horas em detrimento duma realidade sofrida
ou de um tempo passado em família. Despimo-nos virtualmente em
confidências alimentadas pela solidão e pela fome de esperança. Depois
de meia dúzia de palavras estamos já a contar coisas tão íntimas que
alguma inibição sempre nos impediu de contar aos melhores amigos,
trocamos fotografias quase sempre verdadeiras, números de telefone,
experimentamos o jogo da sedução, há quem seja mais ousado, combine
encontros, faça sexo... virtual. Mas o que procuramos afinal? Um
verdadeiro amigo? Uma maneira apenas de passar o tempo? Um amor ou um
simples flirt? Estaremos a tornarmo-nos a nós próprios em personagens de
um enorme jogo virtual, seremos nós os novos Sims? Estaremos a
substituir a nossa família e amigos por pessoas que não conhecemos, como
os amigos imaginários da nossa infância? Porque desabafamos, por que
nos sentimos tão mais à vontade com estes novos amigos/desconhecidos do
que com aqueles que conhecemos de anos e anos de convivência? Porque
sentimos por vezes como nossas as suas expectativas, carregamos as suas
dores, as suas necessidades, ansiamos por fazer parte das suas vidas,
procurando a palavra Online à frente de um endereço de email? Estará a
vida real a perder protagonismo à medida que as dificuldades económicas e
emocionais aumentam ou será a internet uma concha onde nos escondemos,
um anti-depressivo deste novo século onde a famosa luz ao fundo do túnel
vem agora de uma webcam? Todas as rosas por mais bonitas têm espinhos,
mesmo que algumas não nos façam sangrar a pele. Este mundo novo e cheio
de potencial pode ser tão maravilhoso quanto o uso que lhe dermos, mas
não substituirá nunca a vivência das coisas, dos cheiros. Quem viu "Os Substitutos", protagonizado por Bruce Willis,
sabe que a ficção poderá não estar tão distante da realidade como
poderíamos pensar.
(extraído de A-voz-das-palavras.blogspot.pt)
(extraído de A-voz-das-palavras.blogspot.pt)
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